Zília Nazarian (*)
Anos atrás, tive uma querida cliente de arteterapia, uma senhora nos
seus quase 90 anos, muito delicada e elegante. Tinha por princípio, tomar
vinho tinto em sua própria taça, todos os dias ao almoçar. Mantinha
assim, uma tradição francesa, que trouxera de sua terra natal. Sentava-
se em sua mesa de canto, de onde avistava todo o espaço da sala de
refeições do residencial onde habitava. Que coisa admirável, observar
como uma pessoa pode, mesmo na velhice, não perder sua autoestima,
seu jeito de ser e saborear a vida, apesar das adversidades.
Morava num quarto de um sobrado para idosos, descendentes de
europeus. O marido, havia morrido ali mesmo e ela então decidira
permanecer na casa, que já se tornara um lar. Sim, um lar, pois ela havia
transformado seu quarto, num espaço acolhedor, afetivo, cheio de
objetos, livros, móveis e arte, que refletiam sua personalidade e seus
desejos.
Um dia, quando cheguei para nossa sessão costumeira, a encontrei
profundamente triste. Me contou que a casa onde morava ia fechar e que
seria obrigada a ir para um novo endereço. Comovida com sua situação,
fiquei muda por um instante, circundando meu olhar por aquele seu
“quarto/lar” e em seguida, minha boca disse as seguintes palavras: “Tenho
a certeza, de que em qualquer lugar que a senhora estiver, reconstruirá
seu belo ninho e isso é o que importa!”
Esse caso que conto, serve para ilustrar o fato, de que se nosso “canto”
for organizado e mobiliado do jeito que a gente gosta, já é um bom
suporte para os desafios da vida. Como arteterapeuta e biógrafa de
idosos, posso afirmar com convicção, que estar acolhido em um local
onde objetos e móveis lhe são caros afetivamente, esse espaço se torna
um ninho, um lar, um recanto de paz e conforto.
Lar e ninho são palavras muito significativas, pois traduzem acalanto,
solidez e repouso, fundamentais no viver.
Ao longo dos anos, atendi e dialoguei com muitas pessoas acima dos 70
anos, tanto em seus lares habituais, como em centros-dia e residenciais
próprios para a terceira idade e percebo que a questão do isolamento e
distanciamento da família que “não tem mais tempo” para estar próxima,
é amenizada, se o idoso estiver em meio a seus símbolos de afeto como
por exemplo: cadeira que foi do avô, fotos do pai, lenços da mãe, cartas dos filhos, álbum de casamento, imagens de santos de sua devoção,
livros, arte que fez com as próprias mãos etc.
Incluí aqui a arte como símbolo de afeto, pois o fato de criar algo com
as próprias mãos, potencializa capacidades esquecidas ou desconhecidas
e leva o indivíduo a um novo patamar, aquele do orgulho de si mesmo.
Expressar o sentimento em uma matéria física, traz mais leveza à vida,
autoconhecimento e autoestima e isso é um consenso entre
arteterapeutas. Segundo o psicólogo/arteterapeuta Jean-Luc Sudres
(2004), a prática artística, rompe a monotonia dos dias e ancora o
indivíduo no presente, gerando uma ideia de trabalho e a noção de
responsabilidade, fatores que contribuem para o bem-estar das pessoas,
principalmente aquelas que adentraram a terceira idade.
Trouxe aqui, entre inúmeras outras possibilidades, dois temas que podem
trazer mais felicidade à vida do idoso: o Lar e a Arte!
Pesquisa
SUDRES, J-L, La Personne Agée em Art-Thérapie, De l’expression au Lien Social: Paris,
rsonne Agée em Art-Thérapie, De l’expression au Lien Social: Paris,
L’Harmatan, 2004.
(*) Zília Nazarian é biógrafa e arteterapeuta
Oi Zilia gostei muito de seu texto. Ele fala de acolhimento ao processo do envelhecer com leveza e sabedoria
Verdade Marli, é a sabedoria dos tempos que deve ser aproveitada. Abraços
Zília, gostei da ideia de responsabilidade inserida na prática artística. Responsabilidade consigo e com seu legado. Parabéns!
Gostei do texto e da ideia da atividade artística como opção de função no processo do envelhecimento .
A arte é essencial em qualquer idade. Abraços
O artigo tem várias dicas interessantes que podem ser aproveitadas em várias áreas. Abraços
Zilia que texto lindo.
Tb gostei da sua profissão.
Vc cuidada com carinho e abraça o Envelhecimento com amorosidade.
Bjbj
É isso mesmo Suely, ela faz o que escreve, o que está mesmo na alma linda. Abraços
Lindo♥️Zilia.
A arte dando vida e sentido. Muitas lembranças lendo seu texto. Os idosos com certeza se sentem acolhidos.
É isso mesmo Juliana, a arte transforma. Obrigado pelo retorno, abraços
Perfeito. Sábias palavras. Envelhecer já é um processo difícil, pois sabemos que cada um da família tem suas prioridades e sabemos que um dia ficaremos só. Mas tudo na vida é como você encara essa realidade. Coloque leveza e alegria em sua caminhada. Com certeza os objetos de uma vida toda ajudam a suportar o processo. São lembranças da sua vida.
Leveza e alegria são mesmo essenciais nessa caminhada do envelhecimento saudável. Valeu o retorno, abraços
Parabéns Zilia, bonito texto!
Sou aqurelista, posso afirmar a arte é minha amiga e companheira! Gosto de pintar nas minhas caminhadas! Viagens!
Você, como ninguém, conhece bem a importância da arte na vida das pessoas Lucy. Abraços