Por Ivani Cardoso
Envelhecer não dói, mas não é fácil. Você começa a perceber a mudança aos poucos no rosto, no corpo e na alma. As prioridades mudam, o olhar também. Eu sempre gostei de velhos e a palavra aqui não tem preconceito, tem a realidade. Desde muito jovem adorava conversar com os jornalistas mais experientes da redação, aprendia muito, fiz grandes amigos.
O meu envelhecer ficou melhor, bem melhor, depois que eu passei a fazer parte do Grupo de Reflexões do Ideac, há cerca de oito anos. Estudar a velhice, trocar experiências e perceber melhor os próprios sentimentos têm sido fundamentais no meu caminho.
E como eu acredito muito que nós somos responsáveis por um envelhecer mais leve, fiquei encantada quando comecei a divulgar o livro “Canta… Sabiá!” da escritora Carolina Ramos, de Santos, atendendo ao pedido da amiga designer Mônica Mathias, que fez a edição. Ela está com 97 anos e esse é o seu vigésimo livro, concluído justamente nessa pandemia. O isolamento social para ela foi e está sendo difícil, mas ela reagiu com criatividade e bom humor. E teve todo o apoio do segundo marido, Cláudio de Cápua, jornalista e escritor, nessa empreitada.
Carolina é uma pessoa doce, culta, menina criada com rigor da época, educada em colégio de freiras e formada para ser esposa e mãe. Mas ela mudou seu caminho com a literatura. As trovas, a poesia, contos e romances foram acontecendo e trazendo forças para que a mocinha tímida ousasse buscar seus sonhos, participasse de concursos, de apresentações culturais e o que foi o melhor: conquistasse muitos amigos.
Inspiração é a palavra que a contempla. Nessa semana, em uma entrevista para a TV, ela terminou assim: “Enquanto houver vida, a gente sempre tem algo a dizer e a fazer”. Palmas para ela!
Com três filhos, quatro netos e cinco bisnetos e com uma vitalidade incrível, ela mantém vários projetos pela frente (já está escrevendo a próxima obra). Quando perguntam o segredo, Carolina revela brincando: “Todos me dizem há muitos ano que eu não pareço a idade que eu tenho. Então eu digo que o segredo é esse mesmo, eu acredito que não pareço e pronto”.
Ela escreve desde menina. Nas aulas com a famosa professora de Português Zulmira Campos, no Colégio São José, em Santos, Carolina caprichou na primeira dissertação, mas a decepção foi enorme e fez com que ela travasse sua escrita por muitos anos: “Eu me derramei no texto, mas na hora da nota a professora me passou um sermão, dizendo que tinha dedo de gato. Fiquei tão triste que passei a fazer textos curtos e sem muita inspiração para que isso não ocorresse de novo. Levei anos para abrir as asas para a imaginação novamente. Dona Zulmira ficou minha amiga mais tarde, mas nunca comentei com ele esse episódio”.
Ainda bem que o trauma passou e ela continuou escrevendo. Carolina Ramos marcou sua trajetória com sua obra, participações em concursos culturais e presença ativa em instituições como Instituto Histórico e Geográfico de Santos, União Brasileira de Trovadores, Academia Santista de Letras, Academia Feminina de Letras e Centro de Expansão Cultural. E para quem quiser acompanhar o lançamento virtual neste sábado (21), às 16 horas, pelo Facebook da Pinacoteca Benedicto Calixto ou pelo link do YouTube abaixo. Eu participo fazendo as perguntas que ela responde com a simplicidade e alegria que a caracterizam.
Para finalizar, conto que ela não tem redes sociais, não usa celular e nem quer saber disso. Mas usa o e-mail e escreve diariamente para os amigos e participa de grupos culturais de todo o Brasil. Não importa o meio, a sua mensagem chega.