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Vestimentas para o corpo envelhecido

Suely Tonarque (*)

Não aceitamos que envelhecemos para não nos aproximarmos do nosso morrer. Falamos e vivemos negando nossa finitude, o relógio pontua todos os dias, semanas, meses e anos até chegar o momento final. Mesmo estudando, pesquisando para compreender melhor o envelhecimento, ainda se faz presente o contestar a própria velhice, camuflando o corpo que perdeu o brilho da juventude.

Como escreve Gabriel Garcia Marques, no livro Memórias de minhas putas tristes: “Debaixo do sol abrasador da rua comecei a sentir o peso dos meus noventa anos, e a contar minuto a minuto, os minutos das noites que me faltavam para morrer”. Tamanho é o desejo de viver, que tentamos “presentificar” cada acontecimento, de modo a tornar mais desafiante o ato viver/morrer.

Nosso corpo ao envelhecer se transforma aos poucos, e como isto ocorre devagar, não temos a dimensão da mudança, do tamanho do quadril que na adolescência era 38, na fase adulta 42 e na velhice 46/48, isto é, a metamorfose é concreta…o corpo vai sendo alterado.

Na minha experiência de muitos anos como profissional da moda, e na minha pesquisa sobre o vestir no envelhecimento, comprovo que o corpo envelhece, e tem sim um vestir diferenciado.

Nós, mulheres mais velhas, não podemos e não devemos esquecer que temos uma história de vida, uma estrada, na qual construímos uma trajetória percorrida por e com este corpo, que agora nos shoppings, nas boutiques geralmente “não encontra vestimentas adequadas”.

O vestir e a moda têm uma história. “Não é evocando uma suposta universalidade da moda que se revelarão seus efeitos fascinantes e seu poder na vida social, mas delimitando estritamente sua extensão histórica” (Lipovetsky, G.)

Em 1947, C. Dior lançou o Newlook, estilo caracterizado pelo alongamento da saia. Em 1960 o jeans era usado pelos adolescentes rebeldes americanos, influenciando jovens do mundo todo.

Foi no início dos anos 60, no século XX, que as reinvindicações ganham força com a emancipação das mulheres. Os mais atuantes neste tipo de vestimentas foram os hippies, entre 1960 e 1967, surgindo nos Estados Unidos e sonhando com uma sociedade baseada na “Paz/Amor”.

Todas essas mudanças no vestuário foram fartamente difundidas pelos meios de comunicação. A confecção em série é a única forma de fornecer roupas a todas as classes sociais. Um pequeno grupo de estilistas de diferentes origens apresenta coleções em New York, Milão, Paris e Tóquio, criando e vendendo “moda” pelo mundo todo.

André Courréges (1923-2010), criava roupas para as mulheres que as deixassem à vontade para levarem uma vida ativa.

Pioneira da moda da mulher emancipada, a casa Chanel, nascida em 1920 e fechada em 1939, voltou em 1945, apostou na ideia de “tailleur”, feita em “tweed”. Mostrava com isso que Chanel é usado por mulheres do mundo todo e que será sempre moda.

Este é um breve resumo da História da moda no mundo, e registro isso para nos aproximar, na medida do possível, do nosso corpo que envelhece, que se veste, e que possamos acomodá-lo com novos ajustes e com harmonia, isto é, vestir o corpo velho.

Negamos a velhice quando se diz: “Tem moda para velho?”

Não tenho resposta para esta pergunta, porque cada pessoa tem sua forma de se compor, já possui uma história de vida para aceitar ou negar a sua própria velhice, e só vai aceitar que existe sim vestir o corpo que envelhece quando perceber a mudança e transformações do seu corpo. Na sociedade de consumo, mesmo uma pessoa se apresentando como pesquisador sobre o envelhecimento, ainda é difícil aceitar o seu próprio envelhecimento e tão pouco o do outro.

As roupas refletidas para vestir o corpo que envelhece são todas pesquisadas para atender um público diferenciado, um público que aceita se apresentar na contra mão da moda e desconstruir a maneira uniformizada de vestimentas.

Virgínia Woolf (1882-1941) no seu livro Orlando diz que podemos sustentar o ponto de vista de que são as roupas  que nos usam, e não nós que as usamos;  seguindo esse raciocínio podemos fazê-las tomar a forma do braço, ou do peito, mas elas moldam nosso coração, nosso cérebro, nossa língua, à sua vontade.

(*) Suely Tonarque é gerontóloga, especialista em moda no envelhecer e integrante do Grupo de Reflexões do Ideac.

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