Maria Celia de Abreu (*)
Revendo os três textos anteriores (Estive no X CIEH, Informações e ideias para ajudar alguém a ser um melhor profissional, e Desaprender é preciso), que, junto com este, podem estar reunidos sob o título geral de Saber sobre o envelhecimento me faz ser um profissional melhor? – posso resumir o que está lá nos seguintes tópicos:
- devo identificar meu ikigai:
- é bom que eu esteja aberto a estímulos e informações que venham do ambiente sem me restringir ao tema da minha especialidade, uma vez que a gerontologia é multifacetada;
- não posso escapar de estar inserido numa sociedade idadista, mas posso combater o idadismo, o que inclui identificar em mim as falsas crenças sobre envelhecimento e me esforçar para desaprendê-las;
- preciso introjetar alguns conceitos da gerontologia (entre eles: velhice é diferente de envelhecimento, o grupo etário dos mais velhos é o grupo mais heterogêneo de todos);
- além de uma informação sobre a qual não escrevi, porque acho que ela já é bastante conhecida hoje em dia, e não quis ser repetitiva, que é o aumento da longevidade, e o aumento significativo de pessoas idosas no mundo.
Os dados da longevidade, a revolução da longevidade, como diz dr. Alexandre Kalache, precisam ser levados em conta, porque:
1º. A probabilidade de você viver muitos anos é alta; se você é jovem, você vai envelhecer.
2º. Você vai conviver cada vez mais com pessoas mais velhas: na sua família, na sua empresa, no seu condomínio, no supermercado, no trânsito, nas lojas, nas viagens, no salão de cabeleireiro.
3º. Você vai trabalhar com pessoas mais velhas: elas serão seus chefes, seus colegas e seus subordinados.
4º. Você vai produzir para pessoas mais velhas – podem seus clientes diretos, pacientes, fregueses – ou indiretos.
Imagine alguns profissionais cujas profissões são aparentemente independentes de pessoas velhas? Um arquiteto projeta casas – só que por causa do aumento da população mais velha, agora as casas precisam levar em consideração algumas demandas de velhos. Ou elas não serão vendidas. Um empresário administra um hospital – só que a área dos neonatos vai diminuir e a UTI vai aumentar, quem sabe precisa ser aberta uma sessão para cuidados paliativos.
Um designer de joias não quer nem saber de demandas de velhos – mas se as joias dele não atenderem a demandas de velhos, as vendas dele vão cair, porque o grupo de velhos com poder aquisitivo é considerável. Um político precisa dos votos dos velhos para se eleger. Um restaurante precisa ter no cardápio opções para uma pessoa portadora de diabetes. Uma transportadora precisa oferecer degraus extra para que donos de joelhos e pernas comprometidos possam entrar em suas vans com dignidade etc.
Claro que quem conhece o seu cliente, o seu consumidor, o seu companheiro de trabalho, o seu familiar… vai interagir melhor com ele. E estamos caminhando rapidamente para uma sociedade em que haverá velhos em todos os círculos.
Quem está aqui, lendo este texto, de alguma forma já tem interesse pelo envelhecimento, não precisa criar essa motivação. Para quem está aqui porque é um profissional da área, também é ponto pacífico, indiscutível, a necessidade de ter informações confiáveis, oriundas da pesquisa científica, atualizadas. Sobre essas duas áreas não há necessidade de se conversar hoje.
Estou querendo chamar sua atenção para o fato de que, para se tornar um profissional ainda melhor, você precisa investir em setores que nos cursos universitários via de regra são negligenciados, e que dependem de seu esforço:
- ser coerente (quero dizer: seus comportamentos corresponderem às informações que você buscou nas fontes corretas e aos valores que você prega),
- se autocuidar, (lembra que você vai viver muito?)
- e no seu autoconhecimento (explico com exemplos: como você vai tratar um cliente idoso, se você rejeita a ideia de ser idoso? Como você vai responder ao seu cliente idoso que o questiona sobre sexualidade? espiritualidade? morte, finitude? você foge de uma conversa sobre suicídio ou sobre solidão? Como atender o cliente se você não resolveu essas e outras questões igualmente difíceis dentro de você?)
Em conclusão, retomando o nosso tema central: tudo isso faz alguém ser um melhor profissional? Minha resposta é que sim, tudo isso torna você uma melhor pessoa e um melhor profissional.
Quando você se informa sobre envelhecimento, sobre longevidade, sem medo e sem preconceito, e melhora seus comportamentos relacionados com a velhice, há benefícios em três planos temporais:
hoje: você tem um melhor desempenho na sua profissão, e você se relaciona melhor com outros – e com você mesmo
para amanhã: você constrói para você um futuro melhor para sua própria vida (profissional e pessoal)
para depois de amanhã: quando você não estiver mais vivo, algo na humanidade estará melhor, graças a você.
Foi esse o recado que eu quis dar na palestra que fiz no X CIEH e que agora repito aqui, no blog do Ideac.
(*) Maria Celia de Abreu é psicóloga, coordenadora do Ideac e autora de “Velhice, uma nova paisagem”(Ed. Summus)
(Foto Layers/Pixabay)