(*) Jader Andrade
Matei minha mãe.
Comecei a mexer com comida há alguns anos.
Faço pouco coisa.
Mas vou me virando.
Queria fazer lentilhas como ela fazia, buscar aquele sabor que lembrava.
Não encontrei.
Encontro outros que me agradam. Minha lentilha. Sem mãe.
Mato minha mãe, deixando a louça da noite pra lavar no dia seguinte; mato minha mãe quando não me preocupo em deixar a panela brilhante.
Também a mato quando a compreendo naquilo que ela não poderia entender e a amo quando peço perdão pela mágoa causada, sem querer, apenas por eu ser quem sou.
Permito-me.
Não a mato de verdade.
Mãe não se mata.
Mãe apenas é, como consegue ser melhor.
E eu também não consigo ser nada além do que sou neste momento.
Sim, só neste momento, amanhã sou outro.
(*) Jader Andrade é médico e integrante do Grupo de Reflexões do Ideac