Maria Celia de Abreu (*)
Todos nós fazemos parte de uma sociedade, vivemos dentro dela, absorvemos os valores que ela professa: não há como escapar disso. Até há muito pouco tempo atrás, no Brasil, e em quase todo o mundo ocidental, os velhos eram desvalorizados.
Quem é que nos anos 70 não cantou alegremente o delicioso verso de Marcos Vale “Não confie em ninguém com mais de 30 anos”?
Porém, a sociedade é dinâmica, e os velhos cada vez mais representam uma parte importante da sociedade. Os desencadeantes mais evidentes para essa mudança são a diminuição da taxa de nascimentos e o aumento da longevidade, ambos em ritmo rápido e significativo. O século XXI é um tempo de velhos, o que tem a força de uma revolução. Só muito recentemente se está percebendo isso, e mais: se está percebendo que é preciso mudar o conceito de velho, porque ele ficou ultrapassado.
Hoje cantamos “Ando devagar / Porque já tive pressa… Hoje me sinto mais forte/ /Mais feliz, quem sabe” com Renato Teixeira e Almir Sater, ou constatamos com Arnaldo Antunes que “A coisa mais moderna que existe nessa vida é envelhecer”.
Desvalorizar o velho evidenciou-se um conceito falso, que deriva de experiências limitadas ou antiquadas, e não corresponde à verdade universal. Como todo preconceito, faz mal a quem é vítima dele (que é injustiçado e humilhado), a quem se atém a ele (que pratica injustiças e não se permite experiências enriquecedoras) e à sociedade como um todo (que gasta tempo e energia para combater e corrigir distúrbios consequentes ao preconceito, em vez de investir em algo construtivo, positivo).
Às vezes, o preconceito vem fantasiado de carinho, de bem-querer, e nem chega a ser identificado; é preciso um bocadinho de reflexão para perceber que quem se dirige a um idoso como “velhinho”, “fofinho”, “gracinha”, “vovozinho” se sente superior a ele, e desrespeitosamente ignora a longa história de vida durante a qual aquele idoso certamente batalhou muitas batalhas.
Para fazer justiça e trazer equilíbrio à sociedade, é extremamente importante combater valores errôneos, mas não é tarefa fácil. A maneira como nosso psiquismo encontra para abafar nossos pavores e inseguranças é dificultando nossas mudanças internas… é preciso ousadia e determinação para entender por que antigas crenças não são válidas e assumir que novos valores trarão grandes ganhos. Não é fácil. Mas vale a pena!
(*) Maria Celia de Abreu é psicóloga, coordenadora do Ideac e autora de “Velhice, uma nova paisagem”
Que texto encantador ! Gratidão pelas ricas palavras.