Maria Celia de Abreu (*)
Alimento e afeto andam de mãos dadas. A boa qualidade de um tende a facilitar a boa qualidade do outro. Em torno da mesa, a família nutre os tecidos do corpo e também se sustenta emocionalmente. Uma refeição em família simboliza união e comunicação, e isso não tem a ver com iguarias complicadas ou uma simples sopa.
O hábito da família se sentar em conjunto para as refeições fica difícil na correria do dia a dia. Usar esse momento para dizer coisas agradáveis e para rir também é prejudicado pelo estresse em que costumamos viver. Porém, sua importância é tão grande que vale a pena refletir sobre ela e convencer-se de fazer um esforço para montar estratégias para resgatar esse hábito.
Claro que há perdas envolvidas: quem está com a família, está deixando de usufruir da companhia de amigos naquele momento. Claro também que não adianta se reunir para brigar, para se exibir, para chantagear emocionalmente. O momento da refeição deve ser agradável, em que se conversa sobre o dia de cada um, se relata coisas boas e dificuldades, se escuta quem fala, se dá opiniões, se debatem valores, sempre tomando muito cuidado para ser respeitoso e não agressivo. Se nossa família é que nos dá segurança e identidade, para ela devemos oferecer o que temos de melhor em nós (o que com freqüência nos acostumamos a mostrar para amigos e estranhos…). É uma ocasião em que as crianças, os adolescentes e os velhos da família são ouvidos, não importa o quanto sejam hábeis ou inábeis em se comunicar. Experiências e informações são trocadas. É hora de se alimentar intelectual e emocionalmente.
Do ponto de vista da nutrição, come-se sem exagero e mais lentamente, o que é muito saudável, pois a conversa acalma e não se cria a necessidade de compensar afeto de menos com comida demais. Normalmente, quem prepara a refeição vai se preocupar em elaborar pratos mais saudáveis do ponto de vista alimentar, porque o faz de boa vontade e consciente da importância daquele momento.
Fica aqui a sugestão de que esta seja uma tarefa assumida em rodízio, ou então distribuída entre algumas pessoas; uma ideia é que se formem subgrupos misturando um idoso com um jovem ou criança, para juntos assumirem a responsabilidade de preparar a refeição daquele dia; de quebra, as receitas e os truques culinários dos mais velhos vão sendo assimilados pelos mais jovens, o que representa um elemento carregado de muito afeto dentro da família.
O acolhimento, a segurança, o sentimento de pertencer a um grupo familiar são assegurados nos momentos em que as refeições são compartilhadas em torno da mesa.
(*) Maria Celia de Abreu é psicóloga, coordenadora do Ideac e autora de “Velhice, uma nova paisagem”